A Minha Saga do Ensino Remoto com o Google Classroom

Contextualização

Já faz alguns anos que eu desejava tornar não presencial pelo menos uma parte do conteúdo das minhas disciplinas. O modelo de sala de aula invertida despertava muito meu interesse, apesar de saber pouco a respeito. Eu sabia que envolveria um certo tempo e trabalho preparar e gravar os vídeos de forma mais curta e concisa dos conteúdos curriculares das disciplinas, além de planejar novas atividades para a parte presencial. Eu imaginava que poderia ter mais tempo disponível para fazer novos planejamentos e aprendizado em novas mídias caso fosse adotar essa nova metodologia.

No semestre 2020.1 eu ministrei 2 disciplinas: Cálculo Numérico (graduação - Engenharias) e Visualização de Dados (graduação e pós - Computação). Na disciplina de Visualização de Dados, esse processo já estava em andamento, mas ainda muito incipiente. Já havia iniciado a preparação de material, estilo tutorial, para os estudantes estudarem em casa. Já havia experimentado com atividades práticas (seguir instruções para criação de visualizações) e com conteúdo teórico (ler um capítulo do livro texto, depois consultar as notas de aula e ao final responder um questionário de compreensão). Com base no feedback dos estudantes, eu já havia incorporado à disciplina, 12h como carga-horária de educação a distância, conforme as regras da Universidade Federal do Ceará (UFC). Só faltava mesmo gravar os vídeos.

A disciplina de Cálculo Numérico ainda era integralmente presencial e depois de algum tempo ministrando essa disciplina, fui aperfeiçoando o material das aulas de tal forma que ministrá-la de forma presencial tornou-se confortável. O meu trabalho se resumia em minstrar as aulas, atender estudantes com dúvidas, corrigir tarefas e provas. Não quero dizer que seja pouco trabalho envolvido, mas só em não ter que preparar todas as aulas já era uma grande ajuda. Todas as vezes que recebia uma nova disciplina para ministrar, no mínimo 70% do tempo dedicado àquela disciplina referia-se à preparação das aulas.

Quando a pandemia de COVID-19 chegou de forma avassaladora em março, interrompendo de forma abrupta qualquer atividade de ensino presencial, nós professores fomos forçados a converter de forma quase que instantânea nossas disciplinas para o ensino remoto, com curto tempo para capacitação e preparação. Acredito que tive muita sorte em relação à disciplina de Visualização de Dados. A turma era pequena — 15 estudantes, e todos concordaram em assistir as aulas de forma síncrona pela internet. As aulas foram gravadas e disponibilizadas para os estudantes reverem, caso necessário. Ou seja, essa disciplina envolveu pouca ou nenhuma preparação extra.

A situação da disciplina de Cálculo Numérico, com 60 estudantes, foi bem diferente. Após consulta aos estudantes, alguns avisaram que não teriam condições de acompanhar as aulas de forma síncrona. Em março, no início da pandemia, ainda tentei manter contato com eles através de encontros síncronos semanais para tirar dúvidas e fazer revisão do conteúdo, mas essa estratégia de acompanhamento didático não funcionou: poucos estudantes apareciam, as dúvidas nem sempre eram em relação aos conteúdos e os estudantes presentes acabavam se dispersando. Diante disso, resolvi suspender esses encontros até a UFC concluir o seu plano pedagógico de emergência e a partir daí encontrar uma solução que atendesse as necessidades de pelo menos a maior parte da turma.

Minha Preparação

Comecei a fazer todos os cursos promovidos pela UFC que considerei que seriam úteis para mim. Alguns eu desisti no meio do caminho, mas outros foram fundamentais. Assisti a vídeos sobre ensino remoto no YouTube como quem maratona séries na Netflix. Percebi que eu possuía várias limitações, principalmente pedagógicas, e que eu precisava sanar antes de trabalhar o material da disciplina.

Por exemplo, eu não sabia o que era um plano de aula de ensino remoto. Não sabia que existiam ensino remoto emergencial e ensino remoto intencional, e como ter certeza de que o que eu estava fazendo era ensino remoto intencional? Outro problema era adaptar as metodologias ativas para o ensino remoto. Primeiro tive que aprender sobre as metodologias ativas: sala de aula invertida, Team Based Learning (TBL), Instrução por Pares, entre outras. E depois aprendi formas de utilizá-las no ensino remoto, juntamente com as tecnologias envolvidas.

Em paralelo a esse aprendizado intensivo, também comecei a assistir vídeos sobre como gravar e editar vídeos. O curso online sobre podcasting que fiz há alguns anos acabou sendo bastante útil para a parte de áudio. Já usava o iMovie para fazer alguns vídeos caseiros, mas para usar nas aulas gostaria de aumentar um pouco o nível dos meus vídeos. Como eu já possuía uma assinatura do Adobe Creative Cloud, resolvi utilizar o Adobe Premiere Rush (uma versão bem mais simples do Premiere). Ainda não me sentia capaz de usar o Premiere, e não queria perder muito tempo aprendendo uma ferramenta, de fato o tempo era algo bem escasso. Tentei usar o OBS, pois, além de gratuito, ele tinha umas funcionalidades bem interessantes, mas achei tão complicado que acabei desistindo. O Rush possuía portabilidade com o Premiere, e, se decidisse elevar o nível mais uma vez no futuro, seria uma evolução natural.

Bem, depois de mais ou menos um mês e meio aprendendo o que estava disponível nos vídeos, o próximo passo seria decidir as tecnologias.

Que tecnologias utilizar?

Decidir quais tecnologias utilizar certamente foi a parte mais difícil. Como se não bastasse escolher o Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), ainda precisava escolher o aplicativo para web conferência, para comunicação instantânea, para armazenar material em vídeo, compartilhar arquivos, fazer atividades de programação, etc. Durante a minha preparação, analisei várias opções, já tinha uma certa preferência em mente, mas queria conhecer bem todas as opções disponíveis, para enfim decidir de fato que tecnologias usar.

Além das minhas preferências, eu ainda possuía algumas restrições.

Google Classroom como “AVA”

A primeira delas era que eu já estava usando, desde o início do semestre, o Google Classroom (GC) com meus estudantes como repositório do material da disciplina (eu já usava bastante o G Suite disponível para a UFC e não era prático colocar o material que já estava no Drive no SIGAA como recomendado). Meu objetivo era evitar que os estudantes tivessem que aprender a usar outra ferramenta, afinal, eles já estavam sob estresse com toda a situação da pandemia e com a expectativa de um semestre de forma remota.

Fiz um curso aprofundado sobre o SOLAR, um AVA desenvolvido na própria UFC a princípio para ser usado nos cursos EaD da universidade, e, apesar de possuir funcionalidades muito superiores ao GC, algumas limitações foram decisivas para que não optasse pelo SOLAR: os professores não tinham controle sobre as gravações das web conferências, além dessas gravações não serem permanentes. Eu também tinha dúvidas sobre se o sistema teria capacidade de atender a toda a UFC de uma vez. Além disso, eu achei a interface do SOLAR não intuitiva e, se eu (professora da área), que já tinha certa experiência, não estava gostando, imagina meus estudantes das Engenharias! Como eu poderia fazê-los utilizar um sistema que nem eu me sentia à vontade em usar? ☹️

O GC também possuía muitas limitações. Um dos cursos que tentei fazer na preparação utilizava o GC como AVA e vi, da perspectiva de estudante, como ele é limitado e pode ser bem confuso. A rigor, ele não poderia nem ser considerado um AVA, pois é muito simplificado. No entanto, quando utilizado em conjunto com as outras aplicações do pacote G Suite e da Google (ele se integra perfeitamente com o Google Meet, Google Forms, Google Agenda, Google Drive e YouTube), ele se mostrou uma alternativa muito atraente para as minhas necessidades de ensino e aprendizagem dos estudantes. Assim, depois de muita ponderação e de saber que a UFC estava planejando uma integração entre o SIGAA e o GC, facilitando bastante a migração dos estudantes, decidi por utilizá-lo.

Telegram para Comunicação Instantânea

A decisão de utilizar um grupo no Telegram para comunicação em vez de um grupo no WhatsApp foi simplesmente para evitar tornar público meu número de celular, pois o Telegram permite usar um username para identificação. Ainda assim, iria utilizar e-mail, o próprio GC e o SIGAA para comunicação formal, caso os estudantes não desejassem entrar no Telegram. A principal função desse grupo era fomentar o contato entre os estudantes e aliviar um pouco a falta de encontros presenciais. Mesmo que eu não responda às perguntas imediatamente, outras pessoas têm a chance de responder, criando um sentimento de comunidade. Além disso, o grupo me permitiria uma comunicação mais imediata para os avisos importantes.

Google Meet para Web conferência

Para web conferência, além do Meet, considerei o próprio SOLAR, o Zoom, e o Microsoft Teams. Avaliei que de todos eles, o Meet é o de mais simples compreensão e o mais fácil de usar. Além da já existente integração com GC, o fato de se poder gravar os encontros síncronos realizados na época das aulas foram determinantes para a utilização do Meet. Mesmo depois da divulgação de que as gravações seriam temporárias, ainda seria possível fazer upload para o YouTube ou mover a gravação para outro lugar. O Zoom possui funcionalidades muito interessantes, tais como formas de interação entre estudantes e professor ebreakout rooms, que eu adoraria utilizar nas minhas aulas, mas a limitação de chamadas a 40 minutos no plano gratuito foi muito restritiva para mim.

Google Colab para atividades com programação

Para as atividades com programação em python, considerei o Repl.it e o Google Colab. Como os estudantes não tinham muita familiaridade com programação, achei que seria mais fácil seguir instruções que estivessem num jupyter notebook. Como a parte de programação da disciplina era importante, mas não obrigatória (a disciplina não possui carga-horária prática), eu resolvi disponibilizar esqueletos de código em python no Google Colab e nos vídeos práticos, completaria os notebooks. Os estudantes poderiam me acompanhar com seu próprio notebook. Nos vídeos, eu ainda deixei alguns exercícios para fazerem sozinhos depois.

YouTube para distribuição de vídeos

Usar o YouTube foi bem óbvio porque já era bem conhecido por todos. Não verifiquei outras opções. No entanto, as web conferências gravadas não eram colocadas no YouTube, ficavam no Google Drive e eram disponibilizadas apenas no GC.

Preparação das aulas

Tudo começou com um cronograma de aulas (o plano de aulas para ensino remoto que comentei mais acima). Aqui está uma versão do cronograma. Gostaria de ressaltar que ele sofreu mudanças ao longo da disciplina, algumas atividades requereram mais esforço do que eu tinha inicialmente estimado. Outra questão que comprometeu meu planejamento foi que, inicialmente, eu tinha decidido preparar os vídeos a partir do conteúdo onde tinha parado antes do início da pandemia (iria fazer apenas uma revisão das duas últimas aulas). No entanto, um pouco antes do reinício das aulas, houve um novo período de matrícula e recebi outros 5 estudantes na turma. Também me dei conta de que já haviam se passado 4 meses desde a parada repentina das aulas em março, portanto tempo suficiente para esquecer o conteúdo visto no início da disciplina. Diante disso, decidi preparar vídeos de todo o conteúdo da disciplina. Isso acabou atrapalhando o meu planejamento inicial.

Antes mesmo de começar a preparar as aulas, já percebi que simplesmente gravar o vídeo da minha apresentação que já tinha daquela aula não iria funcionar. Além de longo, o vídeo não iria ficar muito dinâmico. Então, reformulei o conteúdo que estava dividido em aulas para módulos. Cada módulo poderia ter um conjunto de vídeos. Para cada vídeo, houve uma fase de adaptação dos slides (tive que criar transições, remover texto e criar animações), depois a gravação com captura de tela e por fim a edição. Procurei fazer vídeos abaixo de 20 minutos, como foi recomendado nos vídeos que assisti e cursos que fiz. No entanto, meus estudantes não confirmaram essa informação que aprendi. Eles pediram que os vídeos pudessem ser até 30 minutos. A vantagem de vídeos curtos é que todo o processo fica mais curto: gasta-se menos tempo na gravação, menos tempo na edição e menos tempo no upload para o YouTube. Depois de gerado o vídeo, eu gerava um arquivo mp3 com apenas o áudio e disponibilizava juntamente com o pdf dos slides utilizados no vídeo. Assim, os estudantes que tivessem limitações de Internet poderiam recorrer ao pdf e ao arquivo de áudio.

Atividades realizadas antes do início das aulas

Confesso que antes do início das aulas, programado para o dia 20 de julho, eu só tinha dois vídeos prontos: um vídeo sobre o GC e um vídeo do módulo 4 (o módulo que iria retomar o conteúdo da disciplina onde havíamos parado anteriormente).

Percebi, com a turma de Visualização de Dados, que para usar todas as funcionalidades do Google Forms com o GC, os estudantes precisariam estar matriculados na turma com o mesmo domínio da conta do professor. Isso foi um verdadeiro problema, pois havia criado a turma no GC com meu e-mail setorial e os estudantes entraram com os e-mails @gmail.com pessoais. Com isso, os estudantes tinham problema de permissão com o formulário e para contornar o problema, eu não conseguia importar de volta para o GC as notas dos quizzes. Assim tive que digitá-las manualmente. Ainda bem que a turma era pequena (15 estudantes), mas eu não estaria disposta a fazer a mesma coisa com a turma de 65 estudantes de Cálculo Numérico.

Felizmente já havia uma solução para o problema: criaria a turma com meu e-mail institucional e os estudantes seriam matriculados na turma com o e-mail institucional deles (@alu). A integração com o SIGAA que estava sendo providenciada ficaria responsável por criar a turma e automaticamente matricular os estudantes. O único problema era que esta integração só estaria disponível no primeiro dia do retorno das aulas.

Pensando nisso, enviei várias mensagens pelo SIGAA para que os estudantes criassem o e-mail institucional, caso não o tivessem ainda. Enviei instruções detalhadas de como fazer isso, criei o grupo no Telegram e pedi para que os estudantes entrassem. Divulguei com eles o cronograma inicial, incluindo as datas dos encontros síncronos. Assim, já poderiam se programar com antecedência. De início já pedi para assistirem ao vídeo sobre o GC enquanto preparava o primeiro módulo, um módulo de boas vindas. Esse módulo incluía um vídeo de apresentação da disciplina que terminei de produzir no dia anterior ao início do semestre, e atividades para que os estudantes se familiarizassem com o GC. Essas atividades não valiam nota, mas valiam frequência. Esse módulo acabou tendo a duração de uma semana porque vários estudantes ainda não tinham entrado na turma do GC e foi o tempo para que eles se ambientassem.

Metodologia utilizada

Com base no curso de Construção de uma disciplina remota do Instituto Universidade Virtual da UFC (aqui e aqui), a metodologia que utilizei foi a seguinte. Separei o conteúdo da disciplina em 18 módulos. Esses módulos ficaram inseridos dentro de 5 + 1 unidades. O módulo de Boas Vindas ficou na sua própria unidade. Em relação à avaliação, resolvi usar 60% da avaliação em ações formativas e 40% em avaliação somativa. Para a avaliação formativa, escolhi portfólios como instrumento de coleta de informações e para a avaliação somativa utilizei quizzes com feedback imediato aos estudantes. Utilizar portfólio para Cálculo Numérico pode parecer uma escolha estranha, mas não achei apropriado fazer prova tradicional. A minha ideia era aproveitar ao máximo as competências desenvolvidas dos estudantes (produção escrita com resumos, exercícios e notebooks jupyter resolvidos). Fazer essa ponderação no GC foi trivial:

Cada módulo possuía:

• Um Roteiro do Módulo onde eu explicava o que eles teriam que fazer naquele módulo (atividades obrigatórias e opcionais). Nesse roteiro estavam claras as informações sobre o que valia nota e o que valia frequência com a carga-horária.
• Conteúdos Assíncronos (normalmente vídeos)
• Portfólio
• Quiz (opcional)
• Encontro síncrono com frequência aproximada de 1 vez a cada duas semanas
• Material de apoio com links e bibliografia utilizada
• Formulário de feedback

Lições Aprendidas

1. A importância do módulo de boas vindas

Recomendo sempre incluir o módulo de “boas vindas” aproveitando-o para explorar os tipos de atividades que você pretende utilizar na disciplina para que os estudantes se familiarizem com elas. Algo que aprendi ao participar de cursos online, é que nunca podemos assumir que as pessoas são “alfabetizadas” nas tecnologias. Faça alguma atividade que envolva upload de arquivo, caso você pretenda utilizar esse tipo de atividade na sua disciplina. Inclua um formulário também. A mecânica de enviar tarefas no GC não é muito intuitiva. Acredito que nesse ponto eu falhei em não explicar logo todos os tipos de atividades que seriam realizadas ao longo do curso, incluindo uma atividade que envolvia fazer upload de arquivos. Logo no primeiro portfólio no módulo seguinte, muitos estudantes não entenderam como fazer as atividades, deixando para fazer de última hora e não conseguindo. Acabei tendo que explicar as atividades que ficaram faltando em um dos encontros síncronos.

2. Clareza nos critérios de avaliação e planejamento flexível

Para evitar desgastes com os estudantes sobre notas ao longo da disciplina, é importante deixar tudo bem explicado no ambiente remoto, incluindo os critérios de avaliação. Leva-se um tempo para que os estudantes se habituem com o processo e não é bom ficar mudando de abordagem ao longo do tempo. Essa era a parte de que mais tinha receio, pois eu não tinha certeza de que a avaliação por portfólios iria funcionar, também não sabia se os estudantes iriam fazer mesmo ou se só iriam copiar. Essa questão dos estudantes copiarem estava tirando o meu sono antes da retomada das aulas, mas depois de ouvir de professores experientes no ensino remoto, que melhor seria relaxar no excesso de controle de saber quem está do outro lado e focar as energias no conteúdo e considerar que os estudantes iriam realmente fazer as atividades com foco na sua aprendizagem. Na minha experiência com o ensino remoto nessas turmas, valeu muito a pena essa confiança, se houve alguma má conduta, foi mínima.

Quanto ao planejamento flexível, é necessário, pois ocorreram alguns imprevistos ao longo da disciplina. Havia subestimado uma quantidade de esforço para um determinado módulo, mas no final tive que ajustar alocando mais tempo para que as atividades de aprendizagem pudessem ser concluídas pelos estudantes com mais tranquilidade. Além disso, muitos estudantes estavam ainda se adaptando a estudar em casa com todos os apelos do dia a dia e a convivência com outras pessoas, afazeres domésticos e até mesmo as inseguranças advindas da pandemia de COVID 19. Por isso preferi ser tolerante em relação aos prazos de entrega das atividades. No meu caso, os estudantes tinham uma semana para fazer os portfólios com mais uma semana de tolerância automática. Outro aspecto relevante, mesmo que o GC avisasse dos prazos aos estudantes, eu ainda precisava alertá-los através de mensagens. Em um dos quizzes, não fiz isso e mais de 20% dos estudantes não responderam. Esse comportamento é bem irracional, pois o quiz é um tipo de atividade somativa e sem segunda chance. Não respondê-lo implica em ficar com 0 pontuação. Ou seja, mesmo sem saber, é melhor respondê-lo de qualquer forma do que não responder. Depois desse caso, passei a alertar os estudantes dos prazos por mensagens no GC e no grupo do Telegram.

3. Roteiro do Módulo é essencial

O Roteiro do Módulo ajudou bastante os estudantes a priorizarem as atividades daquele módulo. Eles sabiam a importância exata de cada item do material no módulo e poderiam concentrar seus esforços no essencial primeiro e depois, se houvesse tempo, nas atividades opcionais. Aqui, também, poderia ser uma oportunidade para um ensino mais especializado. Seria possível dividir o conteúdo, em essencial e avançado. E os estudantes poderiam fazer a atividade de acordo com o nível em que estão.

4. Minimizar a frequência dos encontros síncronos

Uma das primeiras lições que aprendi sobre o ensino remoto foi flexibilizar tempo e espaço, o que é, para mim, a maior vantagem do ensino remoto, levando-se em consideração as condições dos estudantes. O tempo no remoto é diferente do tempo no real. O tempo no real é medido por encontros presenciais. Assim, no ensino remoto, é preciso considerar outras atividades que envolvam o esforço dos estudantes e usar o mínimo de encontros síncronos. Então, mantive a frequência dos encontros síncronos a um mínimo (1 vez a cada quinze dias com duração de uma hora), sem registrar frequência, pois os encontros ficariam gravados para acesso futuro. A principal função dos encontros síncronos era manter contato com os estudantes, conversar, saber como eles estavam, tirar dúvidas e explicar a correção dos quizzes. A presença dos estudantes superou as minhas expectativas, se mantendo em torno de 60% a 70%. Acredito que dessa forma, os encontros síncronos ficaram mais informais e mais produtivos.

5. Produção de vídeos leva mais tempo do que o estimado

É preciso internalizar essa verdade. Se você ainda vai preparar material, principalmente em vídeo, ao longo da disciplina, esse processo vai levar mais tempo do que o estimado. E vai ocupar boa parte das suas noites e fins de semana. Mais ou menos na metade do semestre, eu consegui definir um workflow bem otimizado para preparação → gravação → edição dos vídeos que me ajudou muito, pena que já havia deixado acumular boa parte dos portfólios para serem corrigidos.

6. Portfólios são uma boa forma de avaliação, mas o seu acompanhamento exige tempo que já foi utilizado para a produção de vídeos

Percebi que o sucesso dos portfólios depende do rápido feedback enviado para os estudantes. Como eles faziam parte da avaliação formativa, eles receberiam uma nota independente se o que tinham feito estava certo ou não, mas era preciso alertá-los quando o que eles tinham feito estava incorreto ou incompleto. Nesse processo, eu consegui identificar os estudantes que mais precisavam de reforço no ensino, e concentrei minha atenção no aprendizado desses estudantes. Foi nesse momento que percebi o grande potencial do ensino remoto, pois nós professores deveríamos realmente empregar a maior parte do nosso tempo com os estudantes com dificuldades em aprender. No ensino presencial, como gastamos a maior parte do tempo ministrando a aula, fica mais difícil encontrar esses estudantes, só após a correção da primeira avaliação, quando já pode ser tarde demais. Por outro lado, os estudantes que estavam em franco aprendizado, principalmente os que faziam muito mais do que o mínimo necessário, eu apenas os encorajava a manterem o bom trabalho.

Ao acompanhar os portfólios, pude observar que boa parte dos estudantes não sabia fazer um bom resumo e não sabia estudar sozinho de forma mais eficiente. Acabei mostrando algumas técnicas de estudo, visando uma aprendizagem mais eficiente, mas ainda pretendo produzir alguns vídeos abordando essa questão. Também pretendo focar mais um pouco no tipo de atividade de portfólio, mantendo apenas resumos e exercícios e ocasionalmente autoavaliações.

Assim, eu espero que na próxima edição dessa disciplina, consiga empregar melhor o tempo no acompanhamento dos portfólios, onde está, para mim, o maior valor do ensino remoto.

7. GC ainda não é apropriado para trabalho em grupo

Essa foi a maior dificuldade que enfrentei com o GC. Apesar de todo o potencial de trabalho colaborativo através dos documentos no Drive, gerenciar as notas de trabalho em grupo dentro do GC é um pesadelo. Ainda não descobri uma maneira fácil de fazer isso. Criei um portfólio separado para cada equipe, mas na correção tive que corrigir 12 portfólios em separado. A planilha de notas fica uma bagunça com 11 colunas a mais das existentes. Deveria haver uma maneira de definir portfólios que são feitos em grupos. No final acabei importando a planilha de notas no Excel e combinando as 12 colunas em uma só e utilizando a planilha do excel para um acompanhamento mais realista dos estudantes (ver a lição abaixo)

8. O acompanhamento de notas no GC tem limitações

O acompanhamento de notas no GC é até razoável. Ele facilita bastante a correção das atividades e a visualização das notas. Também permite usar uma média aritmética simples ou ponderada por categorias. No meu caso, eu utilizei a segunda opção. Se o professor da disciplina habilitar, o GC pode exibir para os estudantes essa nota parcial em termos de porcentagem até o momento atual, com uma ressalva: a nota parcial não leva em consideração as atividades atribuídas (pendentes ou não) que ainda estão sem nota. Assim nós professores e estudantes precisamos estar cientes de que aquela nota pode não refletir a verdadeira situação do desempenho dos estudantes. Principalmente no final do semestre, quando ainda tinha uma dezena de portfólios para corrigir e precisava avisar com certa antecedência os estudantes que tendiam a ficar para avaliação final, precisei apelar para uma planilha externa para ter um controle maior. Acredito que se eu mantivesse as correções em dia, conseguiria evitar esse tipo de problema, mas eram muitas situações novas para administrar.

Outra limitação do GC é a inexistência de qualquer controle de frequência (apesar da felixibilização da UFC, ainda era exigido o acompanhamento da presença dos estudantes). Tive que fazer o controle também externamente através de uma planilha acessível pelos estudantes durante toda a duração da disciplina.

9. Investir mais em Metodologias Ativas

Eu não tive muita chance de avaliar o uso da sala de aula invertida, pois como não estava com os conteúdos prontos e disponíveis para a turma, não tinha como dar tempo suficiente para os estudantes verem o conteúdo antes do encontro síncrono. Além disso, a sala de aula invertida exige uma preparação cuidadosa da atividade a ser feita no momento síncrono para que valha a pena.

Outra experiência que tive muito boa foi com Instrução por Pares (Peer Instruction). Após participar de um workshop online com o professor Eric Mazur, o criador dessa metodologia, utilizei as breakout rooms do Zoom (acabei usando o Zoom em vez do Meet) para aplicar essa metodologia e superou as minhas expectativas. Pretendo explicar melhor como fiz em outra oportunidade. Minha expectativa é que consiga experimentar melhor com essas metodologias ativas na próxima oferta da disciplina.

10. Continuamente obter feedback dos estudantes

Algo que fiz desde o primeiro módulo, foi colocar sempre um formulário de feedback do módulo para receber um rápido feedback dos estudantes sobre as decisões tomadas em cada módulo. Nem todos os estudantes o preencheram, mas sei que se tivesse feito algo de muito errado, os estudantes iriam demonstrar sua opinião nesse formulário. Optei por usar um formulário em que o anonimato fosse preservado. Os estudantes precisam estar autenticados no GC para o preencherem, mas não sei quem preencheu. Você pode até colocar como uma atividade caso deseje atribuir uma nota de participação ou frequência depois, mas talvez alterasse o verdadeiro sentido que é saber a opinião dos estudantes sobre os processos de ensino e aprendizagem.

Foi por meio das informações coletadas nesse formulário que percebi que os estudantes estavam gostando do material e das minhas escolhas didáticas. Também percebi que precisava colocar mais exemplos nos vídeos e que, para aquelas turmas, não tinha problema gravar vídeos de até 30 minutos de duração desde que fossem dinâmicos, com pouco texto e com bastantes exemplos.

Considerações finais

Eu acredito que o ensino remoto se estabeleça como alternativa normal (em oposição a excepcional) como mais uma modalidade de ensino nas escolas e universidades. Pelo menos para mim, diante das experiências que adquiri, eu não me vejo voltando ao ensino presencial da forma que era pré-pandemia. Essas experiências e vivências me fizeram vislumbrar oportunidades de melhorar a forma como ensinava e consequentemente de como os estudantes aprendem, principalmente em como posso me dedicar de forma mais personalizada a cada grupo de estudantes em situações diferentes de aprendizado. O caminho é longo, mas o primeiro passo foi dado.

Agradecimentos

À querida amiga Jacqueline Ramos pela leitura cuidadosa deste texto e por suas valiosas sugestões de melhorias.